"Um cozinheiro infectado com o vírus HIV foi despedido, recorreu aos tribunais, porque entendia que a decisão do hotel onde trabalhava era infundada, mas a verdade é que os tribunais não lhe dão razão.
Depois da decisão do Tribunal do Trabalho de Lisboa, agora foi a fez do Tribunal da Relação de Lisboa considerar justificado e legítimo seu o despedimento, revela o jornal Público."
"O jornal teve acesso ao acórdão, onde surge a justificação: «Ficou provado que A. é portador de HIV e que este vírus existe no sangue, saliva, suor e lágrimas, podendo ser transmitido no caso de haver derrame de alguns destes fluidos sobre alimentos servidos ou consumidos por quem tenha na boca uma ferida».
"O jornal teve acesso ao acórdão, onde surge a justificação: «Ficou provado que A. é portador de HIV e que este vírus existe no sangue, saliva, suor e lágrimas, podendo ser transmitido no caso de haver derrame de alguns destes fluidos sobre alimentos servidos ou consumidos por quem tenha na boca uma ferida».
Assim, não poderia continuar a trabalhar, pois era «um perigo para a saúde pública, nomeadamente dos utentes do restaurante do hotel». ""O funcionário recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça."
Fonte: Portugal Diário
Estas decisões judiciárias foram proferidas com base no parecer do médico de saúde ocupacional e ao arrepio de pareceres médicos que defendem, “apesar de o vírus estar na saliva e no suor, existem só três formas de transmissão do VIH: relações sexuais não protegidas, via endovenosa ou via materno-fetal. "
Isto mesmo foi confirmado pelo Dr Machado Caetano (Ex Coordenador do Gabinete de Luta contra a SIDA) no noticiário da SIC, o que só demonstra que a nossa classe judiciária é cada vez mais ignorante o que não deixa de ser assustador.
Este caso, lembra-me o de um médico circurgião também infectado com o vírus da SIDA cuja notícia foi também largamente difundida nos orgãos de comunicação social. Na altura, li que a Ordem dos Médicos estava a investigar quem tinha denunciado o médico. Depois desta notícia, nada mais li sobre eventuais desenvolvimentos deste caso.
Ora, o médico de saúde ocupacional não estaria também obrigado em termos éticos ao dever de sigilo profissional no que à condição do trabalhador como portador do vírus HIV dizia respeito?
Não posso estar mais de acordo com a Ferónica quando diz:
"É sabido que os medos infundados no que respeita ao contágio e transmissão do HIV são ainda muitos e que desde que se conhecem as formas de transmissão que de uma forma mais ou menos intensiva que as campanhas de prevenção têm vindo a tentar sensibilizar as populações para a necessidade de adoptar comportamentos seguros e também de não recearem a transmissão da doença pelo simples convívio ou convivência com seropositivos e doentes de SIDA. Assim sendo, nunca será demais o cuidado e a correcção que se devem ter ao tomar decisões com base na avaliação da possibilidade ou probabilidade de contágio. Qualquer informação imprecisa, vinda de uma fonte supostamente credível, levará os indivíduos a reforçar e/ou validar receios infundados e a aumentar a discriminação dos infectados pelo HIV. Situações que veículam e valorizam principios que do ponto de vista científico são incorrectos, fomentam comportamentos desadequados e em nada beneficiam a luta contra a doença e a sua prevenção."
Nunca serei hóspede da cadeia de hotéis Sana e disse-lhes isso mesmo através deste link depois de lhes ter demonstrado o meu desagrado.
14 comentários:
Opsssss, que eu estou a dormir num.
Amanhã faço o check out. E transmito a minha indignação in loco.
Insaciável
Lollllllllllllllll! A menina é terrível!
tu és de facto espectacular!
nem tenho palavras para te definir
beijos linda
Querida Duca,
Não frequentar hotéis da cadeia Sana, infelizmente, não vai resolver o problema (embora concorde com a atitude de se demonstrar repúdio pela acção de despedimento movida ao cozinheiro). Eles não têm culpa que o tribunal tenha decidido a favor deles num processo contra eles (eu sei, é irónico, mas...).
No meu caso, gostaria era de não ser obrigada a "frequentar" o sistema judicial português que é a verdadeira fonte destas injustiças. Logo, é este que tem de se melhorar e educar. É vergonhoso, como muito bem dizes, o altíssimo nível de ignorância da nossa classe judiciária!
Beijinhos!
Citadina:
Concordo e discordo. Eu sou sempre assim, sou a fã número um da palavra "depende" ...
Concordo com a falta de impacto da decisão de não frequentar a caderia de hoteis Sana porque raramente este tipo de atitudes tem expressão ao nivel dos resultados de exploração destas empresas, discordo porque por infima que seja o impacto destas atitudes, é importante que elas existam e que sejam cada vez mais representativas. A falta de respeito pelos mais elementares direitos mão pode ser olhada com indiferença. Tem algum impacto porque ficarão a saber que há quem discorde e saiba que estão errados e tem impacto porque se não tomasse esse tipo de atitude não faria semtido que me indignasse.
Quanto à afirmação " Eles não têm culpa que o tribunal tenha decidido a favor deles num processo contra eles " , concordo porque é um facto, discordo porque o facto tem um antecedente. Só tem lugar porque eles agiram incorrectamente, foram eles que despediram o trabalhador sem justa causa.
Para terminar, quanto à afirmação "No meu caso, gostaria era de não ser obrigada a "frequentar" o sistem..." Sendo uma manifestação de vontade pessoal não é adequado discordar mas neste caso isso não iria acontecer, concordo em absoluto.
Duca:
Não há duvidas, basta que vejamos os noticiários e a imprensa para validarmos a tua opinião. O nosso sistema judicial para alem de corporativo, lento e disfuncional, está repleto de ignoprancia e desinteligências. É quase uma espécie de monstro que julga ser autonomo quando na verdade a sua existencia é de natureza funcional.
Beijos
Uma, mais uma atitude contestável.
Estúpida, mesmo.
Bj
O que me deixa mesmo preocupado é que os cozinheiros da Sana Hotels libertam a sua saliva, suor e sangue (sabe Deus o que mais) para os alimentos.
ASAE onde andas tu quando és precisa ???
Cara Ferónica,
Partilho o seu entusiasmo pela palavra "depende". Não será um "osso do ofício" de economista, por acaso? (Brinco, mas esta classe profissional é que parece não conhecer outra resposta para qualquer problema que se lhe depare, e contra mim falo).
Concordo quando diz que "A falta de respeito pelos mais elementares direitos não pode ser olhada com indiferença.", embora tenha dificuldade em ver onde está a minha indiferença, uma vez que afirmo claramente que concordo "com a atitude de se demonstrar repúdio pela acção de despedimento movida ao cozinheiro", nomeadamente através de mensagens dirigidas à cadeia de hotéis, que pessoalmente já lhes enderecei.
Eles agiram incorrectamente, é certo, e com base numa ignorância confrangedora e numa cobardia nojenta, mas continuo a dizer: mais grave e preocupante que isso é a entidade que por direito tem o papel de árbitro na sociedade e a obrigação de fazer justiça ter desprezado de forma inaceitável a oportunidade para corrigir e retratar a situação. Depois disto, quem poderá acreditar na Justiça? Eu não.
Citadina
Desta vez vou dar a amão à palmatória: Concordo!
O entusiasmo partilhado pela palavra depende, muito se deve também no meu caso aos "ossos do oficio", só que não da economia. Delizmente, há muitas mais áreas em que vigora a relatividade. A minha área também é mestra nisso.
Musa.
Para deixar um até já,
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Duca
coloco as coisas exactamente ao contrário: é asolutamente urgente e fundamental que se faça compreender aos infectados que têm que ter comportamentos responsáveis e não colocar em risco a vida dos outros, coisa que fazem sistematicamente escudados na posição de coitadinhos que são marginalizados.
de uma vez por todas, estes cidadãos têm que fazer por merecer o respeito e a consideração dos outros, o que acontecerá quando o resto da população tiver confiança neles, que não tem e com razão.
ja expliquei do outro lado e repito aqui. A minha opinião vem do facto de entender que sim, que pode constituir um perigo para a saude de terceiros, como expliquei nos comentários do CC. e isto, não pela eventual transmissão por todos os fluidos corporais mas, exclusivamente, pela evolução natural da doença que inclui periodos de imunodeficiencia que fragilizam o doente e o expõem a varios tipos de infecçãoes nomeadamente a tuberculose. facto que, não oferece duvidas cientificas de especie nenhuma.e, obviamente, aos doentes seropositivos incomoda, nada.
é este um dos motivos porque a tuberculose tem aumentado dramaticamente mesmo dentro da população normal.
portanto, para mim, claramente, a pessoa deve ser afastada da função.
quanto ao despedimento, penso que ele vem da quebra de confiança.
este individuo, quanto a mim, não agiu seriamente.
a atitude correcta seria falar com o patrão, expor-lhe o caso e, para defesa sua e dos outros, pedir mudança de funções. NINGUÉM PRECISAVA DE SABER. se o patrão reagisse com o despedimento, aí sim, teria todas as razões para o processar.
mas não, se o medico não falasse, o coitadinho, ficaria caladinho, a trabalhar sem protecção.
o meio de tudo, a minha pena é que se continue sistematicamente a adoptar a figura dos coitadinhos que , ao fim e ao cabo, é exactamente o que desejam porque é com ela que infectam impunemente centenas, milhares de pessoas, como bem sabemos. eu, pelo menos, sei.
beijos
Cara Cristina
Sou visitante assídua dos seus blogues, que bastante aprecio. Normalmente não encontro no seu discurso nada que a minha veiazinha pirrónica me leve a fazer comentários. Neste caso, não posso estar de acordo consigo e embora a minha formação não me permita um debate fundamentado cientificamente em situação de igualdade, sim, reconheço a sua total superioridade cientifica na matéria, atrevo-me a expor os meus pontos de vista.
Desde já peço desculpa à Duca por utilizar o espaço para “conversar” directamente com a autora de um comentário no seu blog, mas não faria sentido que o fizesse fora do contexto em que foi colocado.
Tenho tendência para me alongar nos discursos e vou por isso tentar estruturar o que gostaria de dizer:
1 – Transmissão da TB.Estou inteiramente de acordo no que se refere à impossibilidade de um doente de TB estar apto para o desempenho das funções de cozinheiro. A forma de transmissão da doença inviabiliza-o.
Sendo a TB uma doença que tem cura, o doente deverá estar de baixa ou desempenhar funções onde não possa ser um perigo para os outros, durante o período (sei que é longo) em que existe perigo de disseminação da doença, só devendo voltar às funções de cozinheiro quando a TB tiver sido curada.
Penso ter sido o que aconteceu uma vez que o individuo terá regressado ao trabalho após baixa médica (suponho que não teria alta médica se não estivesse dado como curado).
2 – A franqueza que considera que deveria ter havido (embora concorde consigo na essência, tal com penso que todos os homens deviam ser livres e que não devia haver pobreza no mundo), representa uma situação que em termos daquilo que é o padrão das politicas de Recursos humanos e das relações laborais no nosso país, algo dificilmente praticável. Por um lado o infectado pelo HIV (tal como qq outro doente) tem direito à confidencialidade, por outro lado sabemos que a probabilidade de recolher compreensão e colaboração por parte de entidade empregadora seria muito baixa.
Recordo que no nosso país é ainda frequente o despedimento de mulheres grávidas ou que engravidaram na vigência de um contrato de trabalho. Como podemos pensar que haveria maior compreensão ou justiça num caso de uma doença infecciosa?
3 - Como saberá, a medicina no trabalho das nossas empresas, mesmo nas grandes empresas, é realizada com a função primordial de cumprir a legislação. É assim uma espécie de Balanço Social, faz-se porque é obrigatório mas não se espera nem se pretende que tenha consequências ou representa uma mais valia para as organizações (até porque se procura cumprir a lei com o menor custo possível).
Medicina no trabalho, tal com a higiene e segurança no trabalho não são vistas como algo em que se investe mas sim como um custo, da mesma forma como as pessoas não são vistas como activos mas sim como recursos.
Se a medicina do trabalho pudesse cumprir as suas funções (e aqui considero existirem culpas partilhadas entre empresas e médicos/empresas de medicina no trabalho), situações como a descrita não constituiriam nenhuma ameaça para a saúde publica, seriam continuamente avaliadas e com base nessa avaliação seria decidido o percurso do trabalhador NA EMPRESA.
Acontece que a medicina do trabalho é o que é. é essencialmente aquilo que as empresas podem ou estão dispostas a comprar. Muitas vezes é só mesmo uma venda de serviços pró-forma em regime de trabalho ambulante, onde numa carripana ou auto caravana dirigida por profissionais de saúde, se percorre de terra em terra e ciclicamente um conjunto de empresas que pagam para se confirmar (ou não) que os trabalhadores gozam de saúde para todo o serviço.
4 – A Doença não é um motivo elegível para despedimento com justa causa. A lei prevê que na existência de uma limitação para ao desempenho de dada função, o trabalhador seja “reconvertido” e passe a desempenhar novas funções compatíveis com a sua condição e qualificações.
5 – Estamos de tal modo habituados a viver com a discriminação e injustiça que até se nos afigura plausível que uma empresa possa despedir um colaborador em função do seu estado de saúde ou que os tribunais decidam à revelia da lei.
6 – Não vejo nem nunca vi os infectados pelo HIV como sendo os coitadinhos que descreve. Considero sim, que pelo medo irracional e desinformado que ainda existe do contágio, por estarem sujeitos a grande discriminação devido aos também ainda existentes estereótipos, que os associam a grupos minoritários específicos dentro da sociedade, devem ser protegidos para que para alem da sua situação penalizante (fisicamente ou psicologicamente) não sejam também alvo de injustiças e agressões.
Não me parece de todo que possamos considerar coitadinhos aqueles que irresponsavelmente continuam a disseminar o vírus HIV.
7 – Por ultimo e em acréscimo à questão do médico dever ou não falar, coloco-lhe uma questão simples. Parece-me que neste caso concorda com a violação do dever do sigilo por parte do médico (que como sabe no caso do HIV é até garantido nas notificações oficiais de novos casos através do sistema das vogais para a codificação da identificação do infectado). Ao dizer: “ … mas não, se o medico não falasse, o coitadinho, ficaria caladinho, a trabalhar sem protecção.” , manifesta implicitamente o seu acordo com o comportamento do médico envolvido.
Gostaria que francamente me dissesse se existem mais situações em que considera dever ocorrer essa violação da ética e do dever de sigilo ou se limitaria o seu acordo com a excepção, a situações laborais em que considere haver perigo para a saúde publica.
Peço desculpa põe me ter alongado
Bjs
O Tempus Blogandi é um blog onde quem comenta pode à vontade "conversar" entre si sem necessidade de pedir autorização ou desculpa à sua autora.
Força minha gente que eu gosto de vos "ouvir".
Sobre o tema que versa este post, vou deixar o link de um texto cuja leitura considero muito interessante.
http://www.ifst.org/uploadedfiles/cms/store/ATTACHMENTS/HIV&foodhandler.pdf
Beijos e bom fim de semana
http://www.ifst.org/uploadedfiles/cms/store/ATTACHMENTS/HIV&foodhandler.pdf
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